terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Minissaia e a liberdade à Brasileira...

Por Adriana Berger, Professora de História e Literatura Brasileiras.

Expresso preocupação com a teoria e a prática da liberdade que se alastram pelo país, a liberdade à brasileira.

Pelo que vi em grandes e pequenas cidades, o Brasil passa por um momento de grande licenciosidade, vulgaridade, superficialidade, besteirol.

Vi meninas dançando em cima de garrafas, sexo aberto em bailes e shows; em novelas, programas de entretenimento, o corpo da mulher é usado e abusado.

90% da programação nacional da TV aberta é sobre cirurgia plástica, cosméticos, penteados, fofocas, brigas domésticas, rezas e "curas", receitas, remédios, cães e bichos, violência, piadas de bêbado e homossexual.

"Psicólogos", "conselheiras" sentimentais e familiares usam sofrimentos de pessoas em programas sensacionalistas.
Há "formadores de opinião" para qualquer assunto.

Afirmo, sem medo de errar, que nós precisamos é de formadores de caráter!

Há um grande apagão cultural. É como se todos estivessem sonâmbulos. Não se discute nada de profundo, alternativas para o país. A juventude, sem sonhos e poesia, não tem em quê ou em quem se inspirar. Contrabando é crime, mas, artigos contrabandeados são vendidos nas ruas, na cara da polícia.

O cerrado e a floresta, destruídos, as cidades em colapso no trânsito e na urbanidade, crime e violência por toda parte. Milhões de brasileiros nas filas de atendimento da péssima saúde pública!

O Brasil continua exportando matéria-prima e importando bugigangas, há baixas produção científica e tecnológica, cada vez menos formandos em matemática, engenharia, física, química, biologia, ciências exatas.

Se escolas e universidades se comportassem como instituições a formar cidadãos para o equilíbrio social e moral do país, discussões públicas velhas e exageradas como essa da minissaia em universidade paulista não prosperaria.

O "x" da questão não está na altura da saia rosa-choque da aluna, mas como, onde e por que, foi usada.
O que fez parte da "imprensa séria", onde microfones e páginas estão nas mãos de "formadores de opinião"? Usou o assunto para aumentar audiência e tiragem!

Isto é critica à Uniban, por seu interesse mercantilista.

O que fez a revista, ao dar capa à minissaia com reportagem cheia de frases do movimento feminista dos anos 60/70?

Nenhuma palavra sobre regras, normas, comportamento nas escolas, em sala de aula, respeito mútuo. Destacaram mulheres com os seios de fora em Brasília, defensoras da garota da capa.

A star is born (Nasce uma estrela)
Com apoio da TV Globo nasce uma estrela nos costumes e no show biz brasileiro.
O cenário se repete: A moça já foi convidada para posar nua; vai desfilar na escola de samba Porto da Pedra.
Em breve poderá ter seu espaço televisivo e ser mais uma formadora de opinião.

No programa "Altas Horas" ela sentou-se na cadeira da fama, mas de jeans. Mandou recado para milhões de garotas: "a roupa é minha, visto como quiser, às sextas sempre vou a baladas e já saio de casa vestida e não devo satisfação a ninguém, aquele vestido é um dos mais discretos que uso". Recebeu apoio de universitárias de Brasília com os seios à mostra: "se quiser ir nua que vá, é a liberdade de cada um; o corpo é meu, ninguém tem nada com isso".

O apresentador do programa, com cara de pateta, cercado por estudantes-tietes, achando-se o máximo por promover a "liberdade".

Uma aluna de minissaia, saltos altos, super maquiada, produzida para baladas, em aula noturna, no meio de marmanjos, ou está com problemas de aceitação, chamando atenção para ser notada; ou não sabe a diferença entre o vulgar e o popular; ou está querendo bagunçar com um confronto premeditado.

Nas escolas do mundo todo há normas, uniformes, regras de comportamento onde muçulmanos, cristãos, budistas, ateus, ricos e pobres, educam jovens que continuarão a defender valores e princípios de seus povos e países.

Psicólogos e professores, ao perceberem o comportamento da aluna, deveriam ter conversado com ela, orientando-a, ajudando-a a superar fobias e rejeições. Não o fizeram.
A reação de estudantes foi desmedida, vazia de conteúdo.

Sem instituições sólidas, cria-se a liberdade à brasileira.
Em que ou em quem se espelha a aluna do microvestido?
O que tem aprendido em ética, valores, comportamento e convivência social? O que ela ouve e vê a seu redor?
"Sou livre, visto o que quiser a hora que quiser".

Num país sem retentores morais, com apatia política e cultural, sem critérios, a garota não tem a quem responder ou dar satisfação, nem em casa, nem na escola; nem à sociedade, nem ao país.

"Se, juiz e desembargador podem, eu posso; se deputado e senador fazem, eu também posso fazer; se o presidente, seus ministros, o prefeito, podem, eu também posso".

A TV incentiva quebradores de regras. Cria espaço para mulher-melancia, samambaia, melão, morango. Popozudas ensinam danças, abrem as nádegas e, se abaixam, para mostrar mais.

O "Fantástico" da TV Globo, no dia 15 de novembro entrou em milhões de lares promovendo o livro e o filme da ex-prostituta Surfistinha, a garota da mina saia e o concurso Menina Fantástico. A Proclamação da República, data histórica do povo brasileiro não interessa. Não dá IBOPE!

Em dez minutos, a Globo daria a milhões de jovens uma necessária aula da queda do Império, da velha República, da Era Vargas, JK, da ditadura militar e, em 15 de novembro de 1989, a Nova República.

Estão rasgando páginas de nossa história. A memória nacional se extingue. Com tanta noticia que precisa ser dada ao povo, o noticiário noturno (Globo), no dia 16/11, se despediu destacando prostituta de noticia velha de tablóide inglês.

O que ensina e estimula a mais rica e poderosa escola do Brasil? Não há na TV aberta brasileira (concessão pública) incentivo ao cumprimento de leis, a regras de respeito mútuo, à solidariedade e cooperação.
Destaques -astros e estrelas- são os da marginalidade, corruptos bem-sucedidos, políticos mentirosos, os da sexualidade vulgar.

Meu querido Brasil: rico por natureza, mas pobre de cidadania, princípios e ética.

domingo, 13 de dezembro de 2009

Acreditar


Um viajante ia caminhando em solo distante,
as margens de um grande lago de águas cristalinas.
Seu destino era a outra margem.
Suspirou profundamente enquanto tentava fixar o olhar no horizonte.
A voz de um homem coberto de idade, um barqueiro, quebrou o silêncio momentâneo, oferecendo-se para transportá-lo.
O pequeno barco envelhecido, no qual a travessia seria realizada, era provido de dois remos de madeira de carvalho.
Logo seus olhos perceberam o que pareciam ser letras em cada remo.
Ao colocar os pés empoeirados dentro do barco, o viajante pode observar que se tratava de duas palavras, num deles estava entalhada a palavra ACREDITAR e no outro AGIR.
Não podendo conter a curiosidade, o viajante perguntou a razão daqueles nomes originais dados aos remos. O barqueiro respondeu pegando o remo chamado ACREDITAR e remando com toda força.
O barco, então, começou a dar voltas sem sair do lugar em que estava.
Em seguida, pegou o remo AGIR e remou com todo vigor.
Novamente o barco girou em sentido oposto, sem ir adiante.
Finalmente, o velho barqueiro, segurando os dois remos, remou com eles simultaneamente e o barco, impulsionado por ambos os lados, navegou através das águas do lago chegando ao seu destino, à outra margem. Então o barqueiro disse ao viajante:
-- Esse porto se chama autoconfiança. Simultaneamente, é preciso ACREDITAR e também AGIR para que possamos alcançá-lo!

A saúde totalitária

ELISABETH ROUDINESCO

ESPECIAL PARA O "LE MONDE"

É na tradição de Georges Canguilhem, para a história da ciência médica, e de Michel Foucault, para a crítica de seus exageros, que Roland Gori, psicanalista e professor de psicopatologia, e Marie-José del Volgo, médica e psicóloga, abordam em um belo ensaio uma das questões centrais para a medicina moderna [em "La Santé Totalitaire", ed. Denoël] : o que fazer com o sofrimento moral dos pacientes confrontados, de um lado, com a grande precisão das técnicas de exame, avaliação e verificação - radiologia, tomografia, ressonância magnética, controles sanguíneos - e, de outro, com a formidável eficácia dos tratamentos pesados: cirurgia, radioterapia, quimioterapia etc.?

Antigamente a morte pertencia a Deus, o único habilitado a dar a vida e a tirá-la. A doença era então considerada uma maldição enviada aos homens que haviam traído as leis da cidade ou da genealogia ou como uma punição infligida àqueles que haviam pecado. Durante séculos, a medicina foi exercida por "homens da arte" - filósofos e práticos - que se encarregavam do governo dos corpos e das almas.

Mas com o surgimento da medicina científica, ao longo do século 19, um novo tipo de médico assumiu o lugar outrora ocupado por Deus. Cercado de respeito, este se pôs a dirigir com a autoridade de um rei o destino de seus pacientes, escondendo deles a verdade e escolhendo para seu bem um tratamento adequado.

Hoje em dia essa situação se inverteu. Transformado em simples especialista, o médico não é mais o senhor em seu domínio. E de repente o paciente é convidado a dar um "consentimento esclarecido" ao tratamento que lhe administram. Mas como ser parceiro de um sofrimento que a ciência médica, muitas vezes, domina somente como estatística?

Pelo próprio fato de sua sofisticação, os tratamentos destinados às patologias graves não podem levar em conta os estados de alma e as angústias ligadas ao surgimento da doença. Pior ainda, às vezes eles têm um efeito devastador sobre o paciente fragilizado. Quem não tremeu enquanto esperava o resultado de um exame que poderia confirmar ou negar um prognóstico sombrio?

Sabemos que os progressos da medicina moderna tiveram como efeito nefasto estender as categorias da norma e patologia a comportamentos sociais que não são conseqüência de uma doença, mas de uma vontade de normalizar as consciências.

Assim nasceram os desvios de um higienismo de Estado, do qual somos herdeiros e que consistem, além das políticas necessárias de saúde pública, em medicalizar todos os atos de nossa existência: paixões, sexo, pensamento, alimentação, modos de vida. Daí o nascimento de uma mentalidade securitária que visa a tornar o paciente responsável por suas doenças e pelos danos que elas causam à sociedade. Hoje, o problema orgânico não vem mais dos deuses nem da natureza, mas de comportamentos humanos considerados desordenados ou errados.

Mas esse progresso também teve por conseqüência favorecer em escala mundial o divórcio entre a abordagem do corpo e a da alma. Quando o especialista dos países ricos se baseia na ciência para aplicar aos pacientes terapêuticas impessoais, este se sente obrigado, para tratar sua alma, a recorrer a medicinas ditas "alternativas" e sem eficácia.

Ao contrário, nos países pobres, onde a medicina científica ainda não foi implantada, as terapêuticas tradicionais se ocupam da alma enquanto finge curar o corpo.

Assim, quanto mais a medicina enriquece em resultados diante da doença, mais ela empobrece em sua relação com o paciente. Mas, quanto mais ela é ineficaz no plano orgânico, mais é benéfica para a alma do paciente cujo corpo é abandonado à morte. Sem renunciar a uma opção explícita a favor da medicina científica e sem ceder jamais a maniqueísmos, Gori e Del Volgo mostram que é preciso reinventar uma abordagem do paciente que leve em conta tanto as necessidades científicas quanto o sofrimento psíquico.

Elisabeth Roudinesco é historiadora da psicanálise francesa, autora de "Jacques Lacan" (Companhia das Letras) e "Por Que a Psicanálise" (Jorge Zahar).

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves.


Dois homens, seriamente doentes, ocupavam o mesmo quarto de um hospital.
Um deles ficava sentado em sua cama por uma hora todas as tardes para conseguir drenar o líquido de seus pulmões. Sua cama ficava próxima da única janela existente no quarto. O outro homem era obrigado a ficar deitado de bruços em sua cama o tempo todo. Eles conversavam muito. Falavam sobre mulheres e suas famílias, suas casas, seus empregos, seu envolvimento com o serviço militar, aonde costumavam ir em suas férias. E toda tarde quando o homem perto da janela podia se sentar, ele passava o tempo todo descrevendo ao seu companheiro de quarto todas as coisas que ele podia enxergar através da janela. O homem na outra cama começou a criar o hábito de esperar por esse período onde seu mundo era ampliado e animado pelas descrições de seu companheiro.
Ele dizia que da janela dava para ver um parque com um lago magnífico, onde patos e cisnes nadavam e muitas crianças brincavam com seus barquinhos de papel. Jovens namorados andavam abraçados no meio das flores que, de tão lindas, encantavam qualquer um que passasse próximo do local.
Grandes árvores cheias de elegância na paisagem e uma fina linha laranja podiam ser vistas do horizonte.
Quando o homem próximo da janela fazia as suas descrições, ele o fazia de modo primoroso e delicado, com detalhes e o outro homem fechava os seus olhos e imaginava a cena descrita.
Em uma tarde quente de verão, o homem próximo a janela descreveu um desfile, que, embora não pudesse ouvir a música podia, todavia, descrever com clareza a linda cena que se passava.
Dias e semanas se passaram desde então. Em uma manhã bonita e ensolarada a enfermeira chegou trazendo água para o banho dos dois homens, mas um deles estava morto...
O homem que estava próximo da janela havia morrido, pacificamente, durante o seu sono noturno. A enfermeira estava entristecida e chamou os atendentes do hospital para levarem o corpo.
Assim que julgou conveniente , o outro homem, pediu para que a enfermeira o colocasse próximo da janela. A enfermeira ficou feliz em poder fazer esse favor e depois de verificar que o paciente estava confortável, o deixou sozinho no quarto.
Vagarosamente, pacientemente, lutando contra a dor, ele conseguiu finalmente apoiar seus cotovelos para olhar pela primeira vez pela janela. Finalmente ele poderia ver tudo por si mesmo. Ele se esticou ao máximo, para poder ver através da janela, e quando conseguiu, deparou-se com um muro todo branco.
Ele perguntou para a enfermeira, assim que teve a chance, o que havia levado o seu amigo a lhe descrever coisas tão belas ao longo dos dias que lhe restavam, pois daquele local a única coisa que podia ser vista era o imenso muro branco.
A enfermeira respondeu que aquele homem era cego...

Filho, nem sempre mostrar a vida como ela é ajuda quem queremos ajudar ou consolar...

Beijo do seu pai...